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sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Quer escapar do fim do mundo em 21 de dezembro? Vá para Alto Paraíso




“E se não sair mais água da sua torneira? E se não tiver mais energia na tomada? E se acabar a comida? O que o povo vai fazer além de enlouquecer e ficar violento?”. Os questionamentos apocalípticos são do alemão Christof Rabanus, um dos moradores de Alto Paraíso que acreditam no iminente fim do mundo. “Melhor se precaver”, argumenta ele, que estoca alimentos como feijão, grão-de-bico e arroz em garrafas pet em sua fazenda no município goiano.
Christof Rabanus, que é analista e professor de “desenho humano”, uma terapia de autoconhecimento ainda pouco conhecida no Brasil, não está sozinho. Por 'fim do mundo' entenda-se o fruto da crença de milhares de pessoas num possível colapso mundial que aconteceria no dia 21 de dezembro de 2012. Essa teoria partiu de uma interpretação do calendário maia, que não teria continuidade após essa data. A civilização maia da Mesoamérica pré-colombiana e as comunidades da Guatemala teriam utilizado tal sistema de anotação. 



Rabanus não sabe dizer, na verdade, em quanto tempo as mudanças irão ocorrer. “Quando vai ser o 21 de dezembro? Pode não acontecer nada nesta data, mas estou prevenido. A transformação sempre chega com certa destruição das formas antigas para abrir espaço para as formas novas”, diz. “Meu objetivo é criar um espaço onde temos o necessário para os processos de transformação que vão chegar”, explica o alemão.

Segundo fim do mundo 
Desde a década de 50, inúmeros movimentos esotéricos se instalaram na região do município goiano atraídos pela fama de o local ser energético (a cidade possui um imenso lençol subterrâneo de cristais) e estar situado no Paralelo 14, o mesmo de Machu Picchu, no Peru, e de outras cidades consideradas sagradas. Além disso, a altitude superior a 1.600 metros tornaria a localidade menos vulnerável a enchentes e possíveis catástrofes climáticas.

Roberval Ferreira
O alemão Christof Rabanus mostra os alimentos que vem armazenando em sua casa

A crença gerou para Alto Paraíso, que fica a 230 quilômetros de Brasília, uma espécie de “turismo do fim do mundo”. A região está cada vez mais cheia, especialmente de estrangeiros que, em sua maioria, creem (no mínimo) em uma mudança drástica após o dia 21 de dezembro. Apesar da resistência de alguns moradores, que temem ser ridicularizados, a verdade é que a cidade está aprendendo a capitalizar a fama. 


Festa rave com direito a palestras, show com um cover de Raul Seixas e meditação à espera de uma nave no Morro da Baleia. Muitas são as opções para quem passar o dia 21 de dezembro de 2012 em Alto Paraíso. Com pousadas lotadas e grande procura para aluguel de casas, o pequeno município que abriga pouco mais de sete mil habitantes se prepara para receber o seu “segundo fim do mundo”, como lembram os alto-paraisenses incrédulos – referência à virada de 1999 para o ano 2000, quando milhares de pessoas se mudaram para o município acreditando no fim dos tempos.

Vai acabar em pizza 
Assim como o alemão Cristof Rabanus, a empresária Ana Maria da Silva, dona da Pizzaria 2012, descreve a sensação de magnetismo que a fez largar a carreira de engenheira em São Paulo para viver no interior de Goiás. Ela esteve pela primeira vez em Alto Paraíso pouco antes da virada do milênio. “Uma amiga me disse que havia um local em que eu poderia levitar se entoasse o mantra indiano ‘om’. Fiz o ‘om’ agudo, grave, de tudo que era jeito, e nada!”, conta, às gargalhadas.

Ana Maria conheceu um grupo que acreditava que uma nave viria buscá-los às 15h de uma tarde de dezembro de 1999. Cerca de 100 pessoas levaram garrafinhas d´água e passaram o dia meditando no Morro da Baleia, um dos pontos considerados “especiais” na cidade. “A nave deu o cano. Voltamos desiludidos, mas felizes porque o mundo não acabou”, diz.
Apesar da decepção, a empresária se encantou com o local. “É comprovado que há essa base de cristais na cidade. É provável que o lugar acelere os sentidos de forma positiva – ou mesmo negativa”, argumenta ela. "Ainda antes da virada do ano, aluguei um ponto comercial na região. Então fui para São Paulo e voltei com um pizzaiolo. Pensei: ‘Se o mundo vai acabar tem que acabar em pizza'", conta. O restaurante, que hoje se chama Pizzaria 2012, na época levava o nome de Pizzaria 2000. Como o mundo não acabou, o nome mudou.
Extraterrestres 
Qualidade de vida, misticismo, crença na existência de seres em outros planetas, salvação. São muitos os motivos que atraem milhares de pessoas à – até então pacata e miúda – cidade de Alto Paraíso.

Ao atravessar os arcos que marcam a entrada do município, um dos cinco cortados pela Chapada dos Veadeiros, o que se vê não representa muito mais do que uma rua. Entretanto, com mais atenção é possível notar o clima que envolve os habitantes do local. Eles se divertem com a fama esotérica da cidade, mas não gostam muito de falar sobre o assunto.
Roberval Ferreira
Ana Maria da Silva largou a carreira de engenheira de produção para abrir uma pizzaria em Alto Paraíso

Um dos pontos mais fotografados é uma casinha simples e colorida que ostenta o seguinte aviso na fachada: “Conserta-se disco voador”. Por sinal, as referências a extraterrestres são as mais populares. Bonecos de homenzinhos verdes aparecem em placas e postes. Em frente ao Chappada Hotel, que no ano que vem vai trabalhar 100% com energia solar e eólica, a estátua de um disco voador com três simpáticos tripulantes extraterrestres chama atenção. A escultura faz parte das convicções do proprietário João Tadeu Severo.
“Acredito em vidas em outros planetas, tanto que estou organizando um congresso de ufologia para o dia 12 de dezembro de 2012, que é quando ocorre o fechamento do ciclo dos 11, que começou em 1 do 1 do 1”, afirma Saboya, que é o organizador do show do cover de Raul Seixas, Tica Seixas, no fatídico 21.
Início de uma nova sociedade 
O francês Laurente Dauzou, professor de yoga da escola Yogastral e dono de um albergue, se mudou para Alto Paraíso há três anos, quando sentiu que não conseguiria mais suportar a pressão do mundo contemporâneo. “Me deixava ansioso. Não aguentava mais o sistema político”, explica ele, que foi apresentado ao município pela atriz Maria Paula, ex-Casseta & Planeta.

Dauzou não acredita no fim do mundo agora. “Estamos acabando um período que se chama kali yoga. Normalmente a filosofia fala que essa época vai continuar. Mas para mim o kali yoga vai acabar agora. É uma época de confusão do mal que vai se encerrar. Depois disso teremos o início de uma nova sociedade”, explica ele.
Com linha de pensamento parecida, Alexandre Cavalcante, dono da pousada Spa do Espírito, comprou o estabelecimento há seis meses. “Acredito num novo despertar de uma nova consciência planetária. Isso já vem acontecendo há alguns anos, e o 21 de dezembro é o ícone para despertar mais pessoas”, afirma ele, que frequenta a cidade há 12 anos.
Numa casa na rua ao lado, o casal Miklos Burger e Marjorie Guimarães conta que também está trilhando o mesmo caminho do empresário. “Decidimos encerrar nossos trabalhos em Salvador para nos mudar para cá”, diz Marjorie. Os dois trabalham com uma técnica de terapia chamada frequência de brilho. Quando o assunto é o fim do mundo, eles trocam olhares de descrença.
Roberval Ferreira
Detalhe da sinalização da cidade: alusões a ETs estão por toda parte

“A Christine Day (australiana, criadora da técnica) enfatiza mais a data do dia 12 de dezembro. Ela vem enfatizando o 10 do 10 do 10, o 11 do 11 do 11, e agora o 12 do 12 do 12. Então, numerologicamente, são datas que têm uma energia de alta frequência. É uma luz muito alta e isso traz mudanças. As coisas densas têm que sair e afloram para serem mudadas, mas não acreditamos em fim do mundo”, adianta Burger.
Dona da Pousada do Mirante, Regina Araújo observa as chegadas e as partidas dos movimentos esotéricos que se instalam na cidade. Estudiosa do calendário maia, ela diz que o que vai acontecer no dia 21 de dezembro é apenas um alinhamento galáctico incomum. “As pessoas vão se alimentar de forma mais natural. O período vai trazer mais leveza. Todos vão estar mais voltados para a harmonia espiritual”, pontua ela.
“O 21 de dezembro significa o fim do ciclo da ‘Conta Longa’. É o início de um novo calendário de 5.126 anos, que é o ciclo da raça. Os maias falam que todas as grandes raças tiveram sua ascensão e depois sua queda neste período. É só isso. Também é o dia do solstício de verão. Eles usavam 17 calendários que em sua maioria eram aplicados na agricultura”, explica Regina.
Apocalipse local 
Morando há 13 anos em Alto Paraíso, Carlos Saboya, ambientalista e coordenador de TI da Prefeitura, pretende se afastar no dia 21 para se resguardar em seu rancho, situado há alguns quilômetros dali. “A cidade já pagou mico algumas vezes, a gente vem servindo de chacota, de gozação”, reclama. “Eu já estou velho, intolerante, fica para os jovens. E eu volto depois do fim do mundo para dar uma força”, ironiza.

O ambientalista faz parte do grupo que compreende a grande maioria dos cidadãos de Alto Paraíso: aqueles que veem o “turismo do fim do mundo” com maus olhos. Os proprietários da pousada Alfa & Ômega, uma das que já não têm mais reservas disponíveis para o período, pensam da mesma maneira. “Esse tipo de agitação não nos interessa. Chegamos a tomar medidas para tentar evitar essa confusão cobrando mais caro e criando pacotes com um mínimo de diárias. Tudo para dificultar a lotação, mas mesmo assim já está tudo reservado”, conta uma funcionária que preferiu não se identificar.
A moça estava na cidade na virada do ano 2000 e guarda más recordações da ocasião. “Dessa vez a cidade está em evidência e acreditamos que vai ser muito pior. Em 2000 faltou água, faltou luz, comida, tudo. A cidade não tem estrutura. E como é um fato isolado cria-se um problema. O mundo não acaba, as pessoas vão embora de repente e cria-se uma inflação. Imóveis de 60, 70 mil estão por 200! Agora o pessoal daqui não tem condição de comprar mais nada”, pontua ela.
Festa do fim do mundo 
O prefeito da cidade, Alan Barbosa, que foi reeleito, já tem resposta pronta quando lhe perguntam se acredita no fim do mundo no dia 21 de dezembro: “Se eu acreditasse não teria concorrido”, brinca. Apesar da polêmica com a população local, ele vê a agitação ao redor do município com bons olhos.

“Todos esses movimentos que se identificaram com Alto Paraíso foram positivos porque vivemos de turismo, de pessoas que vêm conhecer a nossa cidade seja pelo motivo que for”, pondera. E completa: “Quando há questões mais pejorativas fica ruim porque ficamos com cara de palhaço. A cidade atrai pessoas místicas porque tem um histórico. Só que a população mesmo de Alto Paraíso não está ligada a isso”.
De acordo com o prefeito, o plano é tentar capitalizar a situação. “Precisamos explorar esses momentos para trazer gente para cá. E depois da festa do fim do mundo a gente faz a festa do recomeço do mundo”, sugere. “Precisamos é de investimento num circuito turístico porque temos cachoeiras, águas termais, muitas riqueza de verdade”, conta ele.
Apesar de não acreditar no apocalipse, o prefeito já faz planos para a data. “Como dia 12 de dezembro é aniversário de Alto Paraíso, nesse período devemos fazer uma festa nossa, talvez uma semana de festividades. Começamos no aniversário da cidade e esticamos até a festa do fim do mundo”, diz ele.
Para Barbosa, apesar de todas as maravilhas da Chapada dos Veadeiros, a maior riqueza de Alto Paraíso está na diversidade cultural dos habitantes: “Gente que traz influência da Índia para cá, tem alemão, suíço e iraniano. Isso é Alto Paraíso. A nossa riqueza é tratar tudo isso com naturalidade. Tem espaço para tudo quanto é manifestação cultural, religiosa, festas diferentes, eventos diferentes. Temos espaço até para o fim do mundo”. 
Fonte: Ig

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