Para um jornalista, Neil Strauss tinha uma carreira que desafiava comparações:
1) assinou artigos sobre cultura pop para duas das instituições mais importantes do planeta (o jornal New York Times e a revista Rolling Stone);
2) fez longas entrevistas com personalidades como Hugh Hefner, Johnny Cash, Britney Spears, Paul McCartney, Brian Wilson, Courtney Love;
3) publicou a biografia de uma das mais inconsequentes bandas da história do rock ("The Dirt", do Mötley Crüe);
4) publicou a biografia de uma das mais cultuadas estrelas do cinema pornô ("How to Make Love Like a Porn Star", de Jenna Jameson);
5) penetrou no mundo dos homens que dedicam a vida a conquistar o maior número possível de mulheres, os chamados "artistas da sedução", e produziu um tremendo best-seller ("O Jogo - A Bíblia da Sedução").
Mas Neil Strauss estava intranquilo.
Morador de Los Angeles, Strauss sentia que a sociedade estava cada vez mais próxima de um colapso. Terrorismo, catástrofes naturais, crises econômicas: o mundo como o conhecemos poderia ruir a qualquer momento.
Então ele decidiu: era necessário ter um plano B. Dessa decisão saiu "Emergência - Este Livro Vai Salvar Sua Vida". Em quase 400 páginas, Strauss narra a sua transformação de alguém totalmente dependente do sistema para um homem autossuficiente.
Autossuficiente, no caso, não é nenhum exagero. Strauss aprendeu a pilotar avião, a reconhecer plantas comestíveis, a manipular todo tipo de armas de fogo e facas, a matar animais para alimentação, a "ler" pegadas, a apagar incêndios, a montar abrigos com gravetos e folhas, a arrombar carros e fazer ligação direta, a se soltar de algemas.
Neil Strauss até mesmo tornou-se cidadão de outro país (São Cristovão e Nevis, no Caribe), caso precise fugir rapidamente dos EUA. E abriu contas em bancos europeus - também, só por precaução.
"É sobre ter um pânico de ataque geracional. Aprender o que é ser uma pessoa adulta e saber tomar conta de você. Saber que você pode ser autossuficiente." Assim Strauss descreve seu livro ao iG.
"Nos últimos dez anos, os EUA acordaram para a realidade. Muitas coisas aconteceram, como o 11 de Setembro, o furacão Katrina. Desastres que fazem você se dar conta de que o governo não está preparado para agir nessas situações, e que por isso o amanhã é incerto", afirma. "Quando você aprende a sobreviver por uma semana usando apenas uma faca, você passa a não se preocupar tanto com a economia ou em perder o emprego, porque mesmo que não tenha nada, conseguirá sobreviver."
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Cresci em uma cidade grande, em um prédio muito alto, nunca aprendi a fazer coisas, consertar coisas, a acampar. Este livro é sobre aprender coisas que seus pais não te ensinaram. Sobre crescer, ser um homem.
Durante a sua jornada sobrevivencialista, Strauss conheceu os mais diversos tipos, desde um bilionário nova-iorquino em busca de um passaporte até Tom Brown (o "homem da selva" que inspirou o personagem do filme "Caçado"), além de milicianos, ex-mercenários e outras figuras à parte do sistema.
"Em uma emergência, se estivesse num grupo e estivéssemos presos de alguma maneira, precisaríamos de gente com conhecimentos médicos e de sobrevivência. Não acho que um crítico de rock seria alguém útil", brinca.
"Cresci em uma cidade grande [Chicago], em um prédio muito alto, nunca aprendi a fazer coisas, consertar coisas, a acampar. Este livro é sobre aprender coisas que seus pais não te ensinaram. Sobre crescer, ser um homem. Hoje estou menos preocupado com quem está no comando do país e menos dependente do governo. Me parece, por exemplo, que o Ocupe Wall Street e outros movimentos do tipo são feitos por pessoas que esperam que o governo solucione seus problemas. A ideia do livro é a de mostrar que você pode solucionar seus próprios problemas."
"Emergência" se apoia no receio de que guerras, catástrofes naturais e crises podem, de repente, mudar o mundo (para pior). Mas o homem não convive com esse tipo de medo desde sempre?
"Sim, concordo. Mas isso acentuou-se nos últimos anos. Pelo menos nos EUA dos anos 1980 e 1990, achávamos que não havia mais história [referência ao ensaio "O Fim da História e o Último Homem", livro de 1992 em que Francis Fukuyama defendia a tese de que o capitalismo havia vencido a guerra ideológica contra o socialismo], que guerras e desastres não aconteceriam, que a civilização estava avançando. Aí veio o 11 de Setembro. A natureza humana não muda."
Foto: Divulgação
Capa do livro 'Emergência', de Neil Strauss
A leitura de "Emergência" flui fácil, com linguagem direta e capítulos curtos, sintéticos. Há tempero pop e muito humor. Um dos trechos, por exemplo, ganha o título "Por que engravidar uma brasileira pode salvar sua vida".
"Não tive experiência com brasileiras enquanto escrevia este livro, mas tive algumas quando fazia 'O Jogo'", conta. "Um cidadão dos EUA não pode ser extraditado se tiver um filho no Brasil. É incrível que essa iniciativa não seja mais comum."
"O Jogo" fez de Neil Strauss um nome conhecidíssimo nos EUA - e até fora de lá. Ele percorreu o circuito dos talk shows para falar sobre suas técnicas de conquista e o livro foi transformado em reality show ("The Pick Up Artist", pelo canal VH1) e deve virar filme.
"É engraçado porque o livro se tornou algo maior. Muitos empresários e até políticos me perguntam sobre 'O Jogo', porque tem a ver com conhecimentos sociais, em lidar com a mente das pessoas."
Já "Emergência" será levado ao cinema em pouco tempo. O longa baseado no livro será produzido e estrelado por Robert Downey Jr.
Strauss montou ainda uma editora, a Igniter, "que não foi feita para dar lucro, apenas para publicar histórias que merecem ser contadas". Após duas obras, o próximo lançamento da casa será um abiografia do dua Louvin Brothers. "Tocaram com Elvis, Johnny Cash foi influenciado por eles", conta Strauss. Mas tiveram uma trajetória conturbada: "Um dos irmãos tentou estrangular a mulher com o fio do telefone, depois foi baleado sete vezes. É uma grande história americana".
Pasto Elias Rébuli com informações do IG
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